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Notícias Atlântico Sul 

Enxergar o mundo através de novas lentes e de outros sentidos

          
A ideia de publicar um site com  práticas educativas nasceu de uma trajetória que venho percorrendo desde 2010, quando entrei em contato com um texto da autora Nilma Lino Gomes e com a Lei 10.639/2003, que obriga o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira nas escolas.

A partir daí, comecei a entender muitas coisas sobre o mundo e sobre mim mesma, e iniciei meus estudos sobre a Lei 10.639/2003. Na época, eu cursava o último ano do curso de História na Universidade Federal de Viçosa e finalmente pude entender o que me incomodava na universidade: nós desconhecíamos a história dos outros povos – além dos europeus – que construíram e que constroem o Brasil. Todo nosso currículo, visão histórica e referenciais teóricos eram eurocêntricos. 

Esse é um conceito bem complexo e eu vou trabalhar bastante com ele ao longo das aulas. 

Mas, no geral, uma história eurocêntrica é aquela que invisibiliza outros pontos de vista que não privilegiam a tradição e civilização europeia. Por exemplo: somos ensinados a vida inteira nas escolas que os negros são essencialmente escravos, pouco ou nada sabemos sobre a história do continente africano, não conhecemos as personalidades e heróis negros e indígenas da nossa ancestralidade.  

A própria divisão da História em pré-história, história antiga, idade média, moderna e contemporânea são feitas tendo como marcos acontecimentos históricos que se apresentam como universais para todas as sociedades. E se um povo, uma sociedade (como os povos africanos e indígenas) não estão dentro desse parâmetro, eles são considerados SEM HISTÓRIA – como o foram durante muito tempo e como ainda hoje são vistos pela mídia. Para dar alguns exemplos, podemos citar a visão que a sociedade tem dos indígenas como sinônimo de atraso para o desenvolvimento; ou a visão do continente africano  como de barbárie cujos povos brigam entre si - desconsiderando todo o processo de colonização.

A História tem poder. E comunicar e escrever a Histórica é ter poder. Não é à toa que vivemos em um país AFRO-BRASILEIRO, com 54% da população composta de negros e negras, e não sabemos nada sobre nossos antepassados. 

A Histórica do Brasil que conhecemos começa com a chegada dos portugueses e omite milhares de anos de prévia ocupação humana. Isso sem contar a escravização africana, que, segundo o grande antropólogo Kabengele Munanga, o Brasil foi o país da América que mais recebeu pessoas escravizadas. Os números variam muito, especialmente por falta de acesso a documentações precisas, mas estima-se que 11 milhões de pessoas foram retiradas da África para serem escravizadas na América. Destas, 5,5 milhões vieram só para o Brasil. Por que não sabemos sobre todos esses povos que construíram a sociedade brasileira? 

O Brasil foi também o último país da América a abolir a escravidão: mais de 300 anos de escravização entre os períodos colonial e monárquico e 131 anos de liberdade formal desde a Lei Áurea. 

Isso sem contar a escravização e genocídio indígena que também ocorreram.  

A República foi construída tendo como base a falsa ideia de superioridade e inferioridade racial que, mesmo depois da ciência ter desmentido a suposta diferenciação racial da capacidade intelectual, ainda nos deixou um terrível legado.   

Como disse, o eurocentrismo é um conceito muito amplo e complexo e ele não está somente na disciplina de História, mas está presente em tudo, está no ar que respiramos! É como se fosse uma lente na qual enxergamos o mundo. 

A disciplina de história é um lugar privilegiado para tratarmos dessas questões. E é por isso que criei essa editora de conteúdo online para compartilhar as minhas buscas como pesquisadora e professora de História da rede estadual paulista e para construir práticas pedagógicas e científicas a partir de lentes afrorreferenciadas. Eu também sou praticante da Capoeira Angola e a entendo dentro de um universo muito magnânimo da cultura afro-brasileira que pode contribuir com essas outras lentes e outros sentidos. 

Essa não é uma tarefa fácil, e é necessário muita disposição, principalmente, para olhar para si. O que me ajudou a entender isso foi estar em contato com o movimento negro. Em Viçosa, onde eu me formei, criamos um Neab - Núcleo de Estudos Afrobrasileiros - e lá pude compreender melhor a questão racial. E aí pude começar a compreender o que significa ser branca no Brasil. 

O racismo no nosso país é estrutural e estruturante, não depende de uma ou de outra pessoa deixar de ser racista. Toda a nossa sociedade está fundada sobre ele. Existiu a elaboração de uma ideia de suposta inferioridade e superioridade racial, ainda presente nos dias atuais, que rege nossos comportamentos, hábitos, instituições, padrão de beleza e maneira de nos enxergarmos no mundo. É tentativa de retirada da humanidade de pessoas, o que causa efeitos devastadores em seu psicológico, convívio social, trabalho, e na sua vida, pois os jovens negros são os que mais morrem no Brasil, vide o Atlâs da Vioência 2019:   

 Em resumo, constatamos em mais uma edição do Atlas da Violência a continuidade do processo de profunda desigualdade racial no país, ainda que reconheçamos que esse processo se manifesta de formas distintas, caracterizando cenários estaduais e regionais muito diversos sobre o mesmo fenômeno. Portanto, pelo que descrevemos aqui, fica evidente a necessidade de que políticas públicas de segurança e garantia de direitos devam, necessariamente, levar em conta tais diversidades, para que possam melhor focalizar seu público-alvo, de forma a promover mais segurança aos grupos mais vulneráveis (IPEA, 2019, p.51). 


Por isso, é preciso por em prática uma educação afrocentrada e para as relações étnico-raciais, o que significa nadar contra a correnteza, ir contra uma epistemologia branca masculina hétero normativa que invisibilizou outros saberes e culturas cujas visões de mundo, de uma maneira geral, lidam muito melhor com a relação entre seres humanos e natureza. 

Pode parecer clichê, mas o planeta Terra é, de fato, a nossa casa e precisamos ser responsáveis pelo nosso lixo, alimentação, etc. O que eu quero dizer é que o meio ambiente envolve o modo como as sociedade se organizam, e essas são questões intrínsecas às civilizações indígenas e africanas.

A ideia de mundo sustentável - onde os seres humanos vivam em harmonia com a natureza, cooperem entre si, respeitem a diversidade, cuidem do espaço em que vivem - são, por exemplo, atributos de uma filosofia africana chamada Ubuntu. 

No entanto, o apagamento das culturas tidas como subalternas pelos regimentos coloniais foi muito grave para a relação que foi construída entre seres humanos e natureza. E a Ciência foi o locus privilegiado de propagação desse paradigma. Tanto é que os pesquisadores e pesquisadoras que trabalham em uma perspectiva não hegemônica provavelmente tiveram que buscar seus referenciais teóricos fora da universidade, fora da escola. Hoje eu continuei os estudos, passei pelo mestrado, estou no doutorado, mas continuo buscando teorias que estão à margem daquelas eurocentradas e que estão no guarda-chuva teórico do pós-colonialismo. 

Por isso, a ideia é que a Atlântico Sul - nesse contexto - seja uma editora online de conteúdo que reunirá materiais diversos com o fim de colaborar para que a educação rompa com aquelas velhas lentes. Eu chamo de editora de conteúdo porque ela reunirá materiais que possam dar subsídios a outros pesquisadores, professores e pessoas empenhadas em aprender, em ensinar e também em compartilhar suas experiências, materiais didáticos, como vídeos, artigos, e textos de apoio, pesquisas e etc. Caso você se identifique e queira compartilhar a sua prática, entre em contato!


Axé

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